O caçula faz hoje anos. Onze. Mais de uma década! Parece mentira como o
tempo passou a correr. Ainda ontem eras um bebé rechonchudo e chato como
só tu. Nasceste com 4.750 Kg, e 54 cm, enorme, de olhos bem abertos e
curiosos para o mundo. Não eras de todo o típico recém nascido quando
nasceste, parecias maior, e mais consciente do mundo.
Acho
que já antes referi que sou como as burras e faço gravidezes de 10
meses e por isso os piquenos têm de ser retirados, a bem ou a mal,
quando se completam as 42 semanas e, mais uma vez, como aconteceu por
altura dos outros partos, marcámos data.
No dia
anterior, resolvi ir comprar uma roupa pequena, tamanho 0, para te
vestir quando nascesses, para não ficares a boiar dentro do babygrow,
como é costume. A previsão era que tivesses um peso médio, o que quer
dizer mais ou menos 3,500 Kg e daí o tamanho 0. Fail! Eras enorme e
quando chegou a hora de te vestir a tal primeira roupa não havia nada
que te servisse. A enfermeira pedia uma roupa, experimentava e dizia
"não dá, mãe". Outra tentativa e a mesma resposta" não dá, mãe" Terceira
e quarta e nada. Conclusão, tiveste o privilégio de ter como primeira
roupa uma linda bata do Hospital de Santa Maria, azul, com o logo do
hospital impresso, a apertar atrás, que depois gamei para guardar como
recordação.
A mala de roupa que levei para ti foi toda
oferecida ao colega de quarto, o Rodrigo, que nasceu também nesse dia e
que era um ratinho com menos de três quilos. Nova remessa de roupa foi
pedida à avó que trouxe a que estava reservada para o mês seguinte.
Havia romaria no hospital para ver o bebe grande. Era assim que eras
carinhosamente tratado pelas enfermeiras e restante pessoal de serviço.
Eras bonito, o mais bonito de todos!
Quando tivemos
alta começou o tormento. Choravas, sem parar, durante 12-16 horas e nada
te acalmava. Mamavas de duas em duas horas ou menos e esta rotina
manteve-se por longos e penosos seis meses.
Se tivesses sido o
meu primeiro filho não teria tido coragem de ter mais nenhum. Foi uma
verdadeira aventura, no mau sentido, claro. Sempre tinha olhado de lado
aquelas mães que diziam que ter filhos era complicado, uma canseira e
coiso e tal, que andavam de rastos e blá, blá ,blá. Pois, o karma é
lixado. Tudo que duvidei que existisse de menos bom no nascimento de um
filho aconteceu contigo.
Foste uma criança difícil
desde sempre. Choravas que nem um desalmado, sem motivo nenhum. A
empregada que tínhamos na altura, a Larissa, moldava, dizia "este menino
tem um desconforto qualquer". Qual desconforto qual carapuça, o miúdo
era chato mesmo. Se me contassem que havia crianças que choravam tanto e
durante tantas horas seguidas eu não teria acreditado. Não gostavas de
ninguém. Só eu ou o avô Rui te transmitiam alguma segurança. Se alguém
olhava para ti na rua e te falava era um drama. Se eu tinha de te deixar
por qualquer motivo, ficavas com febre até que eu aparecesse. Febres
altas que não cediam nem com medicamentos nem com banhos nem com nada,
apenas com a minha presença. Quando falei nisso ao pediatra ele disse
que nunca tinha conhecido nenhuma criança tão pequena a fazer febres
psicossomáticas, mas na verdade é que as fazias e não foi nem uma nem
duas vezes, aconteciam sempre que te deixava. Não confiavas em ninguém a
não ser mesmo na mãe e no avozinho querido.
As noites
foram más até aos quatro ou cinco anos. Acordavas muitas vezes, choravas
e chamavas acordando-me N vezes durante uma noite e não me deixando
descansar convenientemente. Ainda hoje sonhas muito, falas e gritas e às
vezes damos contigo levantado no meio do corredor. Rapidamente voltas
para a cama quando mandamos e tenho a sensação que és até meio sonânbulo
ou então ainda resquícios dos primeiros anos.
Foi
contigo que percebi o que é o desespero de uma mãe. Tive de pedir ajuda
muitas vezes. Pedir que te levassem para longe de mim porque eu não
aguentava mais ouvir-te chorar e tinha medo de cometer uma loucura
qualquer.
Foi uma primeira infância verdadeiramente de loucos. Já a
gravidez tinha sido difícil. Cinco meses deitada com autorização para
ir apenas à casa de banho e nada mais. O risco de aborto e parto foram
constantes e as malditas contracções não nos largaram durante
praticamente toda a gravidez.
O pediatra achava que
esse inicio de vida complicado seria uma das causas para o teu
desequilibro emocional nos primeiros tempos e eu acredito nisso, mas
perceber o porquê é uma coisa e viver com a consequência outra
totalmente diferente.
Continuas a ser o meu filho
sensível, aquele que absorve as dores dos outros e do mundo e sofre com
elas. Continuas a ser grande, comilão e atento ao mundo que te rodeia,
mas hoje em dia és calmo e tranquilo e até nem és muito introvertido,
gostas de ter amigos e não te importas de viver situações novas com
desconhecidos. Gostas de brincar, como convém, mas não gostas lá muito
de estudar o que é uma pena porque és esperto e podias ser melhor aluno
se não fosses tão preguiçoso. Adoras jogar à bola e tens o sonho de ser
futebolista mas não tens grande jeito para a coisa. O avô continua a ser
uma pessoa importantíssima para ti mas, felizmente, conseguiste,
entretanto, alargar o teu circulo intimo de confiança e és muito próximo
dos manos. A Mónica é uma segunda mãe e o Bruno o herói e modelo que
tentas imitar. Adoro vê-los juntos porque têm uma cumplicidade muito
vossa que me enche de orgulho. Também há discussões, amuos e guerras mas
a relação é forte, de amor e protecção.
Tenho muito orgulho em ti e amo-te de todo o coração. Sê feliz, meu filho!