5 de fevereiro de 2015

Perdão

 
Quando falamos em perdão, pensamos muitas vezes que só perdoamos quando esquecemos o episódio que nos magoou. Para a maioria das pessoas, perdoar está intrinsecamente relacionado com não falar sobre o assunto, esquecer que o episódio se deu, esquecer que determinada pessoa em algum momento da nossa vida agiu mal e nos magoou profundamente. 

Todos enfrentamos em algum momento da nossa vida a questão de saber se posso e consigo perdoar e como fazê-lo. Depois de uma mágoa, injustiça ou sofrimento causado por alguém que nos é próximo, a primeira emoção que nos invade é raiva, incredulidade, dor, traição, injustiça. 

Depois dessas primeiras emoções, coloca-se a questão se se perdoa ou não a pessoa? E perdoar não é esquecer ou desculpar a acção do outro, não é deixar de sentir algo sobre o que se passou, nem tão pouco significa que essa pessoa deve continuar presente na sua vida. Se perdoar não é nada disso que parece ser, então, afinal o que é? 

Perdoar não é algo que se faz pelo outro, mas sim algo que fazemos por nós próprios para termos paz e vivermos com tranquilidade, sem rancores, raivas, ódios e conflitos e, acima de tudo, resolvidos interiormente. Se o fazemos por nós e nos permite curar uma ferida aberta, então, porque é que é tão difícil perdoar? 

Porque, de alguma forma, gostamos da sensação de revolta, da adrenalina que a raiva traz, de nos sentirmos superiores ao outro que cometeu o erro, do medo de sermos de novo magoados se dermos nova chance àquela pessoa, de nos colocarmos no papel de vitima porque isso nos traz dividendos sociais (é bom para muita gente ser "coitadinha") ou apenas porque não se sabe como fazê-lo.

Vou tentar ajudar com pequenas dicas:
 
Antes de mais, deve compreender a situação na sua totalidade: o que aconteceu, como aconteceu porque aconteceu, quais os meus sentimentos, em que é que contribuí, quais os meus limites e necessidades. Como percebem, ao fazer este tipo de auto análise estão a descobrir-se e a desvendar os vários ângulos da situação.

 Analisar depois em que é que o que se passou ajudou a desenvolver em si a sua personalidade. É importante  perceber que a pessoa que você  é hoje está directamente ligada a esse episódio quer porque a (o) amadureceu quer porque lhe trouxe uma nova gama de comportamentos e atitudes face aos outros quer ainda porque desenvolveu uma série de estratégias defensivas e empáticas em relação a quem passou por situações semelhantes. 

O passo seguinte é aceitar a realidade, isto é, integrar o acontecimento na sua vida e identidade actual. Não tente perdoar sem ter percebido bem toda a raiva e dor sentidas, sem ter identificado todas as emoções. 

Sabendo tudo isto e chegado aqui, a questão que se coloca é "quero perdoar?" 
O perdão exige essa predisposição. Às vezes a dor foi tão profunda que se torna difícil querer perdoar ou o outro foi tão abusivo que a dor foi imensa ou ainda porque o outro não parece estar nada arrependido nem sequer pediu desculpa. Deve lembrar-se que ao perdoar está a cuidar de si, está a fazê-lo porque isso é bom para si porque é um passo da cura do sofrimento e da raiva e não para fazer feliz o outro. 

Lembre-se que você foi forte, resistiu à dor, ultrapassou-a e ainda cresceu com isso. Não estou a dizer que temos de passar por essas situações para amadurecer mas não tenham dúvidas que se cresce muito mais na dor do que na alegria. É a dor que nos fornece novos e melhores instrumentos.

Por último, pense no outro e lembre-se que ele ou ela é apenas humano, que quando fez o que fez provavelmente estaria perdido, sem quadro de referências positivo, com crenças e valores distorcidos, desorientado, com necessidades por satisfazer e apenas conseguiu resolver esse momento de forma dolorosa para si. Tente perceber bem quais terão sido os sentimentos do outro e o momento que ele ou ela estava a atravessar. 

Decidir se quer ou não verbalizar perante quem o magoou o seu perdão e decidir se quer manter essa pessoa nas suas relações, são os passos seguintes. Saiba contudo que nem uma coisa nem outra são necessárias. Lembre-se que o acto de perdoar é uma atitude que o irá ajudar apenas a si. 

Diga depois, em voz alta, para si mesmo, eu te perdoo, explicando o mais pormenorizadamente possível as razões que o levam a perdoar. Esta verbalização deve pôr um ponto final sobre o assunto. 

Agora que percebeu o que sentiu, o que aprendeu, o que desenvolveu e qual o papel do outro, deve dar por encerrada a questão e o sofrimento. Vai-se lembrar do que aconteceu mas não permitir que isso lhe traga dor ou raiva. Finalmente, livre deve ser o sentimento que resta. A escolha é sua.



6 comentários:

  1. Excelente conteúdo que deveria ser lido e absorvido por muita gente. O perdão que acho mais difícil é a mim própria. Por mais que racionalize as coisas elas voltam sempre mais tarde como se nenhum trabalho tivesse sido feito :/

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. O trabalho tem de ser feito até ao fim, XL, não pode ficar pela metade, quando já nos sentimos um pouco melhor. É duro e doloroso mas compensa mesmo

      Eliminar
  2. Excelente! A pessoa que alimenta amargura , raiva , rancor e ressentimento fica com a alma como se fosse uma planta seca num vaso , precisando ser regada com água e amor.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. É isso mesmo Meus Poemas e às vezes as pessoas nem se dão conta do que guardam de mau no seu interior

      Eliminar
  3. não vale a pena deixar uma injustiça impune para se sentir bem



    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Permita-me discordar. Tudo vale a pena para se sentir bem, desde que isso não prejudique ninguém

      Eliminar